segunda-feira, 27 de julho de 2009

Exame de DNA – O Princípio Constitucional da Paternidade Responsável e a Permissão de Realização Compulsória do Exame

A obtenção de provas no campo do direito deve sempre respeitar a dignidade da pessoa humana, fundamento da própria República Federativa do Brasil (art. 1º, III, da CR/88), sob pena de ser taxada de ilícita. Não obstante, a razoabilidade e a finalidade constitucional devem sempre pautar a análise da licitude da prova, de modo a adequar às peculiaridades de cada caso concreto.
Em não sendo absolutos os direitos e garantias fundamentais, o não reconhecimento devido por parte do genitor de sua prole, de modo a violar com tal abstenção o direito individual personalíssimo 1 do menor ao reconhecimento de sua filiação biológica (não obstante seja ele adotado 2), assim como o interesse social e a ordem pública existentes na declaração de paternidade, de modo a não cumprir com uma paternidade responsável, compactuamos com o posicionamento segundo o qual indica que: "o princípio da paternidade responsável, consagrado no § 7º, do art. 226, deve ser compatibilizado com o princípio da dignidade humana durante a produção probatória, permitindo-se a realização compulsória do exame de DNA – por métodos não invasivos –, como por exemplo, coleta de fios de cabelo ou mesmo da saliva." 3
No mesmo sentido está ainda do posicionamento do Tribunal Constitucional Espanhol, para o qual:
"os direitos constitucionais à intimidade e à integridade física não podem converter-se em previsão que consagre a impunidade, com desconhecimento das obrigações e deveres resultantes de uma conduta que teve uma íntima relação com o respeito a possíveis vínculos familiares". 4
Dessa forma, entendemos plausível, no caso de negativa do eventual pai biológico em se submeter a teste de vínculo genético via o fornecimento de sangue, que o mesmo seja compelido, em fase probatória a ceder amostra de sua saliva ou fio de cabelo, de modo a tornar possível a realização da investigação médica.
Ademais, a posição do Ministro Sepúlveda Pertence está em sentido ainda mais benéfico à prole, permitindo submeter o suposto genitor compulsoriamente ao exame hematológico de DNA, tendo em vista o risível sacrifício à inviolabilidade corporal (singela "espetada" da agulha) em relação à eminência dos interesses constitucionalmente tutelados de investigação da própria filiação (STF – Pleno – HC 76.060/SC – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – fonte: DVD Magister, versão 23, ementa 10014015, Editora Magister, Porto Alegre, RS) e Informativo STF, nº 107, abr. 1998).
Outrossim, em nossa singela opinião, pensamos que, em caso de neto que desejam investigar a relação de parentesco com supostos avós, visto já admitida pela jurisprudência do STJ 5 a legitimidade daqueles para demanda investigatória de relação parental avoenga, a realização compulsória do exame de DNA é cabível, eis que pauta-se em idênticos fundamentos.
Por fim, louvável é a Súmula 301, do STJ, a qual induz a presunção relativa de paternidade do suposto genitor que se recusa a se submeter ao exame de DNA. Igualmente digno de louvor, os dispositivos 231 e 232, do Código Civil, os quais impedem o aproveitamento da recusa pela parte que negou a se submeter a exame médico necessário, e o suprimento da prova que se pretendia obter com a perícia médica ordenada pelo Magistrado pela própria recusa da parte em se submeter aquela.

NOTAS:

1 - Não obstante se tratar de direito personalíssimo, caso já se tenha iniciada a Ação de Investigação de Paternidade, poderão nela continuar, em que podemos chamar de legitimação ativa superveniente, os herdeiros do falecido autor, desde que não julgado extinto o processo (art. 1.606, do Código Civil).

2 - Conforme decidiu o Ilustre Superior Tribunal de Justiça:

ADOTADO. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. POSSIBILIDADE. - A pessoa adotada não é impedida de exercer ação de investigação de paternidade para conhecer sua verdade biológica. - Inadmissível recurso especial que não ataca os fundamentos do acórdão recorrido. - Não há ofensa ao Art. 535 do CPC se, embora rejeitando os embargos de declaração, o acórdão recorrido examinou todas as questões pertinentes. (AgRg no Ag 942352/SP, Rel. Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS, 3ª TURMA, J. 19/12/2007, DJ 08/02/2008 p. 678 – Fonte: DVD Magister, versão 23, ementa 11427331, Editora Magister, Porto Alegre, RS).

3 - Moraes, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional – 5. ed. – SP : Atlas, 2005, p. 2165.

4 - in Llorente, Francisco Rubio. Derecho fundamentales y princípios constitucionales. Barcelona: Ariel, 1995, p. 151-178.

5 - Sobre o tema acompanhe os julgados abaixo apresentados:

AÇÃO RESCISÓRIA. CARÊNCIA AFASTADA. DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO DECLARATÓRIA DE RECONHECIMENTO DE RELAÇÃO AVOENGA E PETIÇÃO DE HERANÇA. POSSIBILIDADE JURÍDICA. CC DE 1916, ART. 363. I. Preliminar de carência da ação afastada (por maioria). II. Legítima a pretensão dos netos em obter, mediante ação declaratória, o reconhecimento de relação avoenga e petição de herança, se já então falecido seu pai, que em vida não vindicara a investigação sobre a sua origem paterna. III. Inexistência, por conseguinte, de literal ofensa ao art. 363 do Código Civil anterior (por maioria). IV. Ação rescisória improcedente. (AR 336/RS, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO JUNIOR, SEGUNDA SEÇÃO, j. 24/08/2005, DJ 24/04/2006, p. 343 – Fonte: DVD Magister, versão 23, ementa 11304510, Editora Magister, Porto Alegre, RS).

RELAÇÃO AVOENGA. RECONHECIMENTO JUDICIAL. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. - É juridicamente possível o pedido dos netos formulado contra o avô, os seus herdeiros deste, visando o reconhecimento judicial da relação avoenga. - Nenhuma interpretação pode levar o texto legal ao absurdo. (REsp 604154/RS, Rel. Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, j. 16/06/2005, DJ 01/07/2005, p. 518 – Fonte: DVD Magister, versão 23, ementa 11283863, Editora Magister, Porto Alegre, RS)

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